Não é novidade para ninguém que o servidor da saúde trabalha exposto a agentes nocivos, seja em ambientes hospitalares, seja em unidades de saúde básica.
Exatamente por isso, é muito comum que recebam o adicional de insalubridade. O que nem todos sabem é que essa exposição gera direitos previdenciários. No entanto, o Poder Público quase nunca observa isso no momento da aposentadoria, especialmente se o profissional de saúde for servidor concursado.
Isso é muito importante para quem ainda vai se aposentar. Também é especialmente relevante para os profissionais de saúde que já se aposentaram, mas com os chamados proventos proporcionais.
Para quem ainda não se aposentou, garantir o reconhecimento do tempo especial pode antecipar em anos a aposentadoria. Para quem já se aposentou sem proventos integrais ou paridade é possível pedir uma revisão para melhorar o benefício e, talvez, atingir esses proventos máximos.
Essas possibilidades existem porque dá para converter o tempo especial em tempo comum, aumentando o tempo de contribuição considerado no cálculo da aposentadoria. E em alguns casos, até convertendo essa aposentadoria para integral.
Nas próximas linhas, explicaremos o que é o tempo especial, como ele é convertido em tempo comum, e como isso pode impactar o valor da sua aposentadoria. Também forneceremos orientações sobre como solicitar essa revisão.
O que é tempo especial para o servidor da saúde?
O tempo especial é o período em que um trabalhador fica exposto a agentes nocivos à saúde. Esses agentes podem ser físicos, químicos ou biológicos, acima dos limites de tolerância estabelecidos por lei.
Na área da saúde, muitos profissionais têm direito ao reconhecimento desse tempo especial. Médicos e enfermeiros trabalham em contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas. Técnicos de laboratório manipulam substâncias químicas ou material biológico. Radiologistas trabalham com equipamentos de raios-X, além de outros casos não citados aqui.
Os agentes nocivos mais comuns na área da saúde incluem agentes biológicos (vírus, bactérias, fungos), radiações ionizantes e substâncias químicas (como gases anestésicos, quimioterápicos).
É comum que o servidor da saúde receba o adicional de insalubridade quando está exposto a esses agentes. Contudo isso não é suficiente para o reconhecimento do tempo especial, o que esclareceremos mais a frente. Não basta, portanto, receber a insalubridade para que o tempo especial seja reconhecido.
Regras de aposentadoria e tempo especial para o servidor da saúde
Antes das recentes reformas previdenciárias, o tempo especial afetava a aposentadoria de duas formas principais:
Na primeira forma, permitia a aposentadoria com menos tempo de contribuição. No caso dos profissionais de saúde, poderia se dar com 25 anos de exposição aos agentes nocivos. Isso representa uma redução considerável em comparação ao tempo total exigido sem exposição. Para os homens eram 35 anos no mínimo, e para as mulheres eram 30 anos no mínimo.
Mas era possível, ainda, optar pela conversão do tempo especial em comum, aumentando o tempo de contribuição.
Com as mudanças recentes na legislação previdenciária, as regras para aposentadoria especial e conversão de tempo se tornaram mais restritivas.
Em síntese, essa conversão não é mais possível para os servidores federais desde 13 de novembro de 2019 (data que a Reforma passou a valer). Para os servidores estaduais e municipais a partir da data em que as Reformas da Previdência próprias foram implementadas. Somente o tempo anterior à Reforma é que poderá ser convertido.
Nos Estados e Municípios onde ainda não houve Reforma, permanece a possibilidade de conversão de tempo especial em tempo comum até a data em que a Reforma for realizada. E mesmo onde houve a Reforma é possível que a legislação tenha mantido a possibilidade da conversão.
Portanto, é necessário que o servidor da saúde consulte a legislação específica do seu ente empregador para saber em detalhes sobre a conversão do tempo especial em comum.
Conversão do tempo especial em tempo comum
De qualquer modo, a conversão do tempo especial em comum é uma alternativa muito interessante para “turbinar” o tempo de contribuição do servidor. Essa conversão é feita aplicando-se um fator de multiplicação ao período trabalhado em condições especiais. Para os profissionais de saúde, esse fator é de 1,4 para os homens, e 1,2 para as mulheres.
Vamos ver um exemplo prático:
Maria, enfermeira, trabalhou por 10 anos em um hospital, exposta a agentes biológicos. Para converter esse tempo especial em comum, multiplicamos:
10 anos x 1,20 = 12 anos
Assim, os 10 anos de trabalho especial de Maria equivalem a 12 anos de tempo comum para fins de aposentadoria. No nosso exemplo usamos o tempo em anos para simplificar, mas a forma correta de fazer esse cálculo é converter o tempo especial em dias, e depois aplicar o fator.
Um dos fatores que consideramos no cálculo da aposentadoria dos servidores públicos é o tempo de contribuição, então quanto mais melhor!
Impacto do tempo especial para servidores da saúde ativos e aposentados
E é aqui que a mágica acontece: servidores da saúde que não atingiram ainda o tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria pela regra geral podem, com a conversão, antecipar a aposentadoria sem precisar chegar no tempo mínimo de contribuição.
De igual forma, servidores que se aposentaram com proventos proporcionais podem melhorar o valor de suas aposentadorias, ou até mesmo conseguir a conversão dessa aposentadoria proporcional para uma aposentadoria com proventos integrais!
Homens ou mulheres que tenham 25 anos ou mais de exposição, com a conversão já atingiriam o tempo mínimo de contribuição nas regras anteriores à Reforma, que, mais uma vez, seria de 35 anos para o homem e 30 anos para a mulher, garantindo a aposentadoria integral.
E não sendo esse o caso, a conversão ainda assim pode ajudar a melhorar a aposentadoria. Veja este exemplo: João, técnico de laboratório, se aposentou proporcionalmente com 28 anos de contribuição, sendo 20 anos em condições especiais. Para se aposentar com proventos integrais ele deveria ter 35 anos de contribuição.
Agora vamos ver como ficaria o cálculo antes e depois da revisão:
Antes da revisão:
28 anos / 35 anos (tempo necessário para aposentadoria integral) = 80% do benefício
Após a revisão:
20 anos especiais x 1,40 = 28 anos
28 anos (convertidos) + 8 anos (comuns) = 36 anos
36 anos / 35 anos = 100% do benefício (limitado a 100%)
Neste exemplo, João passaria a ter direito ao benefício integral, um aumento significativo em sua aposentadoria.
Haverão casos em que essa conversão apenas melhorará a proporcionalidade da aposentadoria, o que já é uma vantagem, considerando que a aposentadoria é um benefício vitalício.
E, claro, a conversão de tempo especial em comum também vale para os servidores que se aposentaram após a Reforma da Previdência, porque na pior das hipóteses é cabível a conversão até 13/11/2019, o que já pode significar um aumento significativo na aposentadoria do servidor da saúde.
Como solicitar a conversão
Você pode solicitar a conversão por via administrativa ou judicial, dentro de um pedido de aposentadoria ou revisão de aposentadoria, sendo essencial que o servidor da saúde tenha o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) e o Laudo técnico das condições ambientais de trabalho (LTCAT), documentos indispensáveis para o reconhecimento do tempo especial.
Não adianta apenas ter recebido o adicional de insalubridade, pois o que comprova a exposição efetiva aos agentes nocivos é o PPP e o LTCAT, portanto somente com esses documentos é que a revisão é viável.
Você pode solicitar esses documentos diretamente no RH do seu órgão, que tem a obrigação legal de fornecer ao servidor da saúde o documento para a instrução do processo de aposentadoria ou revisão.
O ideal é que o servidor peça o quanto antes que esses documentos sejam fornecidos, pois os órgãos costumam demorar vários e vários meses para concluir o processo, o que pode atrasar o pedido de aposentadoria ou de revisão de aposentadoria.
Conclusão
O reconhecimento do tempo especial representa uma oportunidade significativa para os servidores públicos da saúde, seja para antecipar a aposentadoria, seja para melhorar o valor do benefício já concedido. Como vimos, através da conversão do tempo especial em comum, é possível aumentar consideravelmente o tempo de contribuição para o cálculo da aposentadoria.
É fundamental que os servidores da saúde, tanto os que ainda estão na ativa quanto os já aposentados, verifiquem seu direito à conversão do tempo especial.
Para isso, o primeiro passo é providenciar o PPP e o LTCAT, documentos indispensáveis para comprovar a exposição aos agentes nocivos.
Vale ressaltar que mesmo após as reformas previdenciárias, é possível converter o período anterior às mudanças, o que já pode representar um impacto significativo no benefício.
Considerando que a aposentadoria é um benefício vitalício, qualquer aumento em seu valor representará uma melhoria permanente na qualidade de vida do servidor.
Por isso, é altamente recomendável que os profissionais da saúde busquem orientação especializada para avaliar seu caso específico e, se cabível, iniciar o processo de revisão o quanto antes, evitando a prescrição das diferenças devidas.
Valorizar o trabalho dos profissionais de saúde é reconhecer sua importância fundamental para a sociedade.